terça-feira, 28 de dezembro de 2010

Crônica 1


"A crônica não tem pretensão de durar, uma vez que é filha do jornal e da era da máquina, onde tudo acaba tão depressa. Ela não foi feita originalmente para o livro, mas para essa publicação efêmera que se compra num dia e no dia seguinte é usada para embrulhar um par de sapatos ou forrar o chão da cozinha."
Antônio Candido

"Quando um cara tem coragem de gritar que está sofrendo, fatalmente encontra alguém que o compreende e, algumas vezes, o ame. Isso não dá apenas samba. Dá crônica também."
Carlos Heitor Cony

"O exercício da crônica é testemunho de nosso tempo. A crônica, conta conversas, recolhe frases, observa pessoas, registra situações, tudo com um olhar lúdico de quem quer superar a realidade sufocante."
Jorge de Sá
Assista ao vídeo: "O poder das refeições" de Lya Luft


A crônica


A crônica é, primordialmente, um texto escrito para ser publicado no jornal. Assim o fato de ser publicada no jornal já lhe determina vida curta, pois à crônica de hoje seguem-se muitas outras nas próximas edições.

Há semelhanças entre a crônica e o texto exclusivamente informativo. Assim como o repórter, o cronista se inspira nos acontecimentos diários, que constituem a base da crônica. Entretanto, há elementos que distinguem um texto do outro. Após cercar-se desses acontecimentos diários, o cronista dá-lhes um toque próprio, incluindo em seu texto elementos como ficção, fantasia e criticismo, elementos que o texto essencialmente informativo não contém. Com base nisso, pode-se dizer que a crônica situa-se entre o Jornalismo e a Literatura, e o cronista pode ser considerado o poeta dos acontecimentos do dia-a-dia.

A crônica, na maioria dos casos, é um texto curto e narrado em primeira pessoa, ou seja, o próprio escritor está "dialogando" com o leitor. Isso faz com que a crônica apresente uma visão totalmente pessoal de um determinado assunto: a visão do cronista. Ao desenvolver seu estilo e ao selecionar as palavras que utiliza em seu texto, o cronista está transmitindo ao leitor a sua visão de mundo
. Ele está, na verdade, expondo a sua forma pessoal de compreender os acontecimentos que o cercam. Geralmente, as crônicas apresentam linguagem simples, espontânea, situada entre a linguagem oral e a literária. Isso contribui também para que o leitor se ntifique com o cronista, que acaba se tornando o porta-voz daquele que lê.

Há diferentes estilos de crônicas, associados ao perfil de quem as escreve. Todos os estilos, porém, acabam por encaixar-se em três grandes grupos de crônica: as poéticas, as humorísticas e as que se aproximam dos ensaios. Estas últimas têm tom mais sério e analisam fatos políticos, sociais ou econômicos de grande importância cultural.


        Leia a crônica de Moacir Sclyar, reproduzida do jornal Folha de S. Paulo,


Pobre Pequeno Príncipe, perdido em pérfido planeta


Os destroços do avião do escritor e piloto francês Antoine de Saint-Exupéry, autor do livro "O Pequeno Príncipe", foram descobertos no litoral de Marselha, quase 60 anos após seu desaparecimento.
Folha Online Mundo, 7.abr.2004

Como é fácil imaginar, a notícia de que o avião de Saint-Exupéry havia sido finalmente encontrado provocou grande comoção, sobretudo entre os fãs do escritor, ainda muito numerosos. De imediato, um comitê foi formado com o objetivo de trasladar os destroços do aparelho para um grande memorial a ser construído em Paris. Mas quando os encarregados da tarefa dirigiram-se ao local, uma pequena e pedregosa praia não distante de Marselha, tiveram uma surpresa.
De uma gruta próxima emergiu uma figura estranha. Era um velho, talvez octogenário, talvez nonagenário, longa barba, cabeleira desgrenhada, vestindo farrapos. Empunhando uma espécie de pequena espada enferrujada, avançou na direção dos homens:
- O que vocês querem? Deixem esses destroços aí. São do avião do grande Saint-Exupéry.
O chefe da equipe, homem culto e educado, achou que estava diante de um maluco. Mas não perdeu a calma. Em tom conciliador, explicou que os destroços seriam levados para um lugar em que todas as pessoas, inclusive leitores de Saint-Exupéry, pudessem vê-los. O velho abanou a cabeça:
- De maneira nenhuma. Os destroços do avião não saem daqui. Não enquanto Saint-Exupéry não retornar. Eu estou aqui à espera dele há 60 anos e ficarei mais de 60 anos se necessário.
E subitamente enfurecido gritou:
- Sessenta anos, vocês sabem o que é isso? Sessenta anos. Eu era um menino lindo, loirinho, quando vim para cá, diretamente do asteróide B 612, que vocês, aposto, nem conhecem. Agora sou um velho desdentado, reumático, um velho que passa o dia todo resmungando. Não tenho com quem falar, entendem? Não tenho com quem falar. Havia uma flor com quem eu conversava, uma bela flor, mas ela morreu há muito tempo. Havia também uma raposa, muito esperta, que me dizia coisas inteligentes; sumiu. Quanto ao Saint-Exupéry...
Enxugou os olhos:
- Não sei dele. Mas prometi a mim próprio que cuidaria dos restos de seu avião até que voltasse. E cumprirei minha promessa, custe o que custar.
O chefe da equipe tentou de novo ponderar que aquilo não tinha sentido:
- O senhor está vendo, o tempo passou, o mundo mudou...
O velho olhou-o um instante e depois disse em tom de desprezo:
- O mundo mudou? Não é isso o que eu vejo. O meu mundo continua o mesmo. É isso o que eu vejo, e eu é que estou certo. O senhor vê mal as coisas, amigo. O senhor não sabe que, como disse um escritor cujo nome já não lembro, o essencial é invisível para os olhos?
Jogou sobre os ombros o rasgado manto que tinha nas mãos, colocou sobre a cabeça a coroa agora muito pequena, e lá se foi ele, o velho Pequeno Príncipe.


Exercícios


1. A crônica não reproduz a realidade, mas uma visão recriada dessa realidade pela capacidade lírica e ficcional do cronista. Responda.


a) A partir de que acontecimento real foi gerado o assunto da crônica?


b) Que situação inusitada é apresentada na crônica?


2. Identifique as afirmações que, de acordo com o tipo de texto, identificam uma crônica ou uma notícia.


a) Os fatos, acontecimentos e situações são comentados a partir de uma visão subjetiva, incluindo elementos como ficção, fantasia, criticismo.


b) Tem como propósito comunicativo informar, registrar o acontecimento de modo impessoal.


c) Tem como propósito comunicativo entreter, provocar reflexões sobre um fato, expondo uma forma pessoal de compreender esse fato.


d) Faz uso de uma linguagem simples, coloquial e despretensiosa, mas com lirismo e singularidade.


e) Trata os fatos do cotidiano, de interesse da comunidade.


f) Faz uso da linguagem formal, usando uma das normas urbanas de prestígio e pautando-se pela tradição gramatical.


Atividade retirada do Livro ”Diálogo” – edição renovada, 9º ano.



 Produção de texto


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1. Agora, escolha uma das notícias e imagine-se no lugar do cronista que vai dar ao fato uma nova visão. Responda as questões a seguir:
a) O que esse fato desperta em você: surpresa, ironia, riso...?
b) Que personagens podem participar dos fatos?
c) Em que espaço as cenas ocorrerão?
d) Que situação inesperada pode finalizar a narrativa?

2. A partir do que refletiu, escreva uma crônica. Comente esse fato, de modo que o seu ponto de vista, a sua forma pessoal de ver fique evidente.


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