domingo, 2 de janeiro de 2011

Experiências de liberação da linguagem e do pensamento

Experiência de liberação da linguagem e do pensamento

         O primeiro passo para produzirmos um texto que realmente expresse nossa linguagem, nosso pensamento, nossa imaginação criadora, deve ser no sentido de liberá-los de toda a sorte de condicionamentos que os tornam padronizados e mecânicos.

1. Escrita automática: escreva  livremente, de um modo solto e despreocupado, para tudo que vier à cabeça sem parar de ler, sem parar para raciocinar, sem analisar, escrever livremente, do modo mais solto possível, deixando o pensamento e a linguagem e as mãos e o corpo completamente à vontade. - o que vier à cabeça irá para o papel.
Obs.: Se aparecer algum bloqueio, alguma censura, deve ir também para o papel.

2. Associação Livre: associe livremente palavras a outras palavras que vão sendo propostas; de modo livre, sem nenhum  raciocínio, imediatamente. Você escreve a primeira palavras que vier à sua cabeça. Não se preocupe com relações lógicas, não pare para pensar; assim, escreva o mais rápido possível a primeira palavra que lhe vier em relação a

bicho          papel          corpo          fruto      sangue        pedra                  asa             noite           espelho       mar

3. Fluxo verbal: associe palavras fazendo a relação a partir de algum aspecto proposto. Há muitas variantes possíveis.

a) Escreva o maior número de palavras que comecem com a letra dada:   
P        R       T        M       S

b) Escreva palavras que tenham sonoridade semelhante a:
         porto           rua              mato          

c) Escreva palavras que tenham significados semelhantes às palavras sugeridas (não há necessidade de sinônimos, basta que haja semelhança de algum modo):
         corpo           amor           natureza               cidade        trabalho

4. Criação de texto a partir de palavras geradoras: você vai criar um texto, como você quiser, de modo que as palavras abaixo apareçam, na sequência que você quiser.
a)
         Manhã               mão            fábrica                  terra            liberdade
         Nuvem              faca            noite                     pássaro

b)
         sangue                 sapo           grito           maçã           tempestade
         noite                    coração       chapéu        mel

c) a partir de textos, escolha algumas palavras e, em seguida, crie um texto em que elas apareçam.

d) a partir de um texto, escolha uma frase ou mais frases. Em seguida, crie o seu texto, incluindo as frases em algum momento do trabalho.

e) a partir de alguns estímulos visuais – quadro, desenho, escultura, paisagem de janela, etc.

f) a partir de uma música que mexa com você, escolha uma série de palavras e escreva um texto livre.
 
g) a partir das letras do alfabeto, exceto K, W eY.

5. Criação a partir de suas palavras: escreva dez palavras  fundamentais da sua realidade, dez que signifiquem muito para sua vida, que falem muito de você.
         Agora associe cada palavra a outras.
         Em seguida tente fazer um texto livre, que contenham algumas das palavras que você escreveu primeiro e outras das palavras associadas.

6. Criação a partir das palavras do outro: para você realizar essa experiência de modo inteiro, mais fundo, tente se colocar mesmo no lugar do outro, identificar-se com ele, sentir como ele se sente, vivenciar a realidade dele.
         Escolha uma das propostas:
         Um motorista de caminhão
         Um operário de grande indústria
         Um palhaço de circo
         Um jardineiro
         Um jogador de futebol

         Escreva dez palavras fundamentais da vida dessas pessoas. Utilize pelo menos cinco dessas palavras e tente fazer um texto em que uma dessas pessoas fale dela, da sua vida, da sua realidade.

7. Função emotiva da Linguagem:
         Leia alguns fragmentos de textos:

“Eu não tinha esse rosto de hoje,
assim calmo, assim triste, assim magro,
nem estes olhos tão vazios,
nem o lábio amargo.”
                                      Cecília Meireles

“Não sou nada.
Nunca serei nada.
Não posso querer ser nada.
À parte isso, tenho em mim todos os sonhos do mundo.”
                                      Álvaro de Campos (heterônimo de Fernando Pessoa)

“Não amei bastante sequer a mim mesmo,
contudo próximo. Não amei ninguém.
Salvo aquele pássaro – vinha azul e doido –
que se esfacelou na asa do avião.”
Carlos Drummond de Andrade

Os Dois Lados
Deste lado tem meu corpo
Tem o sonho
Tem a minha namorada na janela
(...)
Do outro lado tem outras vidas vivendo a minha vida
Tem pensamentos sérios me esperando na sala de visitas
(...)
                                      Murilo Mendes

“Só uma palavra me devora:
Aquela que meu coração não diz”

Agora fale de você, de sua vida. Tente criar um texto que seja seu retrato vivo e verdadeiro.

8. Enumeração: enumerar é fazer uma lista, uma série, uma sequência de elementos. O texto fica ao mesmo tempo contínuo e descontínuo: cada elemento tem vida própria, e simultaneamente, se relaciona com todos os outros.
Veja:
“O amor é finalmente
um embaraço de pernas,
uma união de barrigas,
um breve tremor de artérias
Uma confusão de bocas,
uma batalha de veias,
um reboliço de ancas,
quem diz outra coisa é besta“.
                            Gregório de Mato

“O primeiro olhar da janela de manhã
O velho livro de novo encontrado
Rostos animados
Neve, o mudar das estações
O jornal
O cão
A dialéctica
Tomar duche, nadar
Velha música
Sapatos cómodos
Compreender
Música nova
Escrever, plantar
Viajar, cantar
Ser amável.

Bertold Brecht, in 'Do Pobre B.B.'

         Escreva um texto enumerativo a partir de um dos temas a seguir:
        
 Algumas felicidades
         Aqui e agora
         Da janela do ônibus
         Centro da cidade
         Retrospectiva do ano que se está vivendo.
 “Amamos o que não conhecemos, o já perdido.” (Borges)
        
                                     
9. Me dá o mote: a partir de “motes” você vai escrevendo o que lhe vier à cabeça, em ritmo de escrita automática.

Exemplos de mote:
         “Quando guri, eu tinha que me calar à mesa: só
         as pessoas grandes falavam.”

         “Melhor pensar apenas imagens...”

         “Gaiolas de passarinhos vazias...”

         “Noite alta, um bêbado passa cantando.”

         “Entre a minha casa e a tua, há uma porta de estrelas...”

         “Havia um tempo de cadeiras na calçada.”

         “Viajar é mudar o cenário da solidão.”

         “Dias sem pássaros, noites sem estrelas.”

         “Atenção! O luar está filmando...”
                                                                           Mário Quintana

(Exercícios retirados do livro “Redação: escrever é desvendar o mundo” de Severino Antônio M. Barbosa)

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