sexta-feira, 22 de junho de 2012

Aquilo - ambiguidade

Leia o texto a seguir para responder às questões propostas. 

Aquilo

- De uns tempos para cá, eu só penso naquilo.
- Eu penso naquilo desde os meus, sei lá, onze anos.
- Onze anos ?
- É. E o tempo todo.
- Não. Eu, antigamente, pensava pouco naquilo. Era uma coisa que não me preocupava. Claro que a gente convivia com aquilo desde cedo. Via acontecer à nossa volta, não podia ignorar. Mas não era, assim, uma preocupação constante. Como agora.
- Pra mim sempre foi. Aliás, eu não penso em outra coisa.
- Desde criança !?
- De dia e de noite.
- E como é que você conseguia viver com isso, desde criança ?
- Mas é uma coisa natural. Acho que todo mundo é assim. Você é que é anormal, se só começou a pensar naquilo nessa idade.
- Antes eu pensava, mas hoje é uma obsessão. Fico imaginando como será. O que eu vou sentir. Como será depois.
- Você se preocupa demais. Precisa relaxar. A coisa tem que acontecer naturalmente. Se você fica ansioso é pior. Aí sim, aquilo se torna uma angústia, em vez de um prazer.
- Um prazer ? Aquilo ?
- Pra você não sei. Pra mim, é o maior prazer que um homem pode ter. É quando o homem chega ao paraíso.
- Bom, se você acredita nisso, então pode pensar naquilo como um prazer. Pra mim é o fim.
- Você precisa de ajuda, rapaz.
- Ajuda religiosa ? Perdi a fé há muito tempo. Da última vez que falei com um padre a respeito, só o que ele me disse foi que eu devia rezar. Rezar muito, para poder enfrentar aquilo sem medo.
- Mas você foi procurar logo um padre ? Precisa de ajuda psiquiátrica. Talvez clínica, não sei. Ter pavor daquilo não é saudável.
- E eu não sei ? Eu queria ser como você. Viver com a perspectiva daquilo naturalmente, até alegremente. Ir para aquilo assoviando.
- Ah, vou. Assoviando e dando pulinho. Olhe, já sei o que eu vou fazer. Vou apresentar você a uma amiga minha. Ela vai tirar todo o seu medo.
- Sei. Uma dessas transcendentalistas.
- Não é daqui mesmo. Codinome Neca. Com ela é tiro e queda. Figurativamente falando, claro.
- Hein ?
- O quê ?
- Do que é que nós estamos falando?
- Do que é que você está falando?
- Daquilo. Da morte.
- Ah. - E você ?
- Esquece.
( Luis Fernando Veríssimo. Sexo na cabeça. Rio de Janeiro: Objetiva, 2002. p. 107-8)

Exercícios: 

1. Explique a que se deve a ambiguidade presente no texto lido.
2. A ambiguidade do texto é reforçada por várias situações, palavras e expressões. Que sentidos assume a expressão “chegar ao paraíso”?
3. Você pode perceber que a ambiguidade pode gerar problemas de comunicação, como ocorreu no texto acima. Qual o motivo que levou o autor a demonstrar a ambiguidade em seu texto? Que efeito ele pretendia provocar no leitor?

Humor - Ambiguidade

Leia e responda ao que se pede:

a) Um garoto pergunta para o outro:
- Você nasceu em Pelotas?
- Não, nasci inteiro.

b) -Doutor, já quebrei o braço em vários lugares.
- Se eu fosse o senhor, não voltava mais para esses lugares.
c) -Não deixe sua cadela entrar na minha casa de novo. Ela está cheia de pulgas.
-Diana, não entre nessa casa de novo. Ela está cheia de pulgas.

d) O bêbado está no consultório e o médico diz:
- Eu não atendo bêbado.
- Então quando o senhor estiver bom eu volto - disse o bêbado.


Atividade

1.Explique o duplo sentido contido em cada uma das anedotas acima.

2.Escolha duas anedotas e reescreva-as de forma a impedir uma interpretação indevida.

quinta-feira, 21 de junho de 2012

Exercícios - Processo de formação de palavras

1. Leia este poema
Ceninha caseira

A família reunida
No almoço do domingo:
- Mãe, me dá laranjada.
- A laranja se acabou.
- Mãe, me dá limonada.
- O limão se acabou.

No almoço de domingo
Da família reunida
Ninguém pede amorada,
Que o amor, também se acabou.
(Sérgio Antunes. Relógio da sala. SP: Salesiana, 1986)

a) Qual o processo de formação das palavras laranjada, limonada e amorada?
b) Pelos primeiros versos, o que se espera que signifique amorada?
c) Qual o significado criado pelo poeta?

2. No poema a seguir, quais os dois processos de formação de palavras que predominam?
Enquanto o peixe-martelo
Bate: toque, toque, toque,
Peixe-serra vai serrado:
Roque, roque, roque, roque.
(Milton Camargo. In: Poesia fora da estante. Porto Alegre: Projeto, 1999. p. 67)

3. Encontre no quadro e copie uma palavra que possa exemplificar cada um dos processos de formação indicados:

Girassol coaxar dentista
Zé cabisbaixo supersônico
pesca Embratel emudecer

a) Derivação parassintética: f) derivação sufixal:
b) Abreviação: g) composição por aglutinação:
c) Derivação sufixal: h) composição por justaposição:
d) Sigla: i) derivação regressiva:
e) Onomatopeia:

4. Leia este poema: (Sérgio Caparelli. Tigres no quintal. Porto Alegre: Kuarup, 1997)
Minha bicicleta

Com minha bíci,
Eu roubo a lua
Pra enfeitar
A minha rua
Com minha bicí
Dou nó no vento
E até fantasma
Eu espavento [...]

a) Que processo de formação explica a forma bíci?
b) Que outras palavras você usa, formadas pelo mesmo processo?
c) Escreva mais dois exemplos de palavras formadas pelo mesmo prefixo ou mesmo radical da palavra bicicleta.

5. Leia o poema.

Super (Ulisses Tavares. Caindo na real. São Paulo: Brasiliense, 1984)

Superpopulação
Superpoluição
Superstição
Supertensão
Socorro, super-homem!!!

a) Qual o processo de formação da maioria das palavras desse poema?
b) Qual o elemento comum a todas essas palavras?
c) O que indica, no texto, o prefixo super ?
d) Por que motivo o poeta pede socorro ao super-homem?

6. José Paulo Paes utiliza também de um recurso linguístico relacionado à estrutura das palavras. Veja:

Seu metaléxico
economiopia
desenvolvimentir
utopiada
consumidoidos
patriotários
suicidadãos
(Os melhores poemas de José Paulo Paes) 

a – O poeta, usufruindo-se de sua habilidade artística, cria um jogo de palavras a partir de outras já existentes na língua. Analise cada verso indicando as palavras de origem.

b – Explicite seus conhecimentos relatando qual foi o processo a que se deve a tal ocorrência.

7. Analise atentamente o poema a seguir, atentando-se para as questões pertinentes ao mesmo:

F o r m a
R e f o r m a
D i s f o r m a
T r a n s f o r m a
C o n f o r m a
I n f o r m a
F o r m a 

a – Estamos diante de um poema concreto de autoria de José Lino Grünewald. De acordo com o processo ligado à formação de palavras, conceitue-o, levando em consideração o radical.


b – Indique a classe gramatical a que pertence o radical e as demais palavras que dele se originaram.

8. Analisando os versos de Guimarães Rosa: “Eu juro que nunca vi moça tão bonitonazinha como a senhora (...) / “E bala é um pedacinhozinho de metal.”

a – Descreva a referida ocorrência levando em consideração o processo que constitui a formação das palavras

Jogos sobre formação no site: http://www.profteresa.net/oficinalingua/oficina_lingua.htm

terça-feira, 19 de junho de 2012

Protesto - pontuação


 Max Nunes é um dos grandes humoristas brasileiros, atuando como redator de vários programas do rádio e da televisão. Leia com atenção um texto de sua autoria.

Protesto
A situação sob o ponto de vista gramatical:
A situação é boa, interrogação.
É boa. Vírgula, é a exclamação.
E, se você protestar ou reticências;
Acaba apanhando, indo para a assistência e levando dois pontos.
E, se você passar muito mal ponto final.

É interessante notar como há uma mistura das expressões de sentido denotativo e conotativo. Aliás, está aí o humor impresso no texto. Da leitura atenta pode-se determinar que

a) a interrogação do segundo verso implica espanto generalizado em razão da situação de protesto.
b) o protesto, seguido pelas reticências, induz à ideia de liberdade de expressão inerente a situações como essas.
c) os dois-pontos presentes no texto não têm uma correlação gramatical como a exclamação e a interrogação.
d) o ponto inicial é uma referência ao sentido gramatical apontado na situação geradora do texto.
e) a morte está estampada no ponto final, assim como os dois pontos, na indignação coletiva do protesto.

domingo, 17 de junho de 2012

Crônicas - Para mim, isso é grego

Adoro brincar com palavras, palavrões, expressões, ditos populares ou impopulares. Descobrir a origem de palavras e frases. Tenho um amigo que me chama de O Rei do Dicionário Abril. Tenho todos, desde 75. Outro dia, no Jô, esbaldei-me (caí dentro de um balde?) de rir com o jornalista Marcelo Duarte, que escreveu um livro imenso (O Guia dos Curiosos, editora Cia. das Letras) só sobre essas bobageiras e, tenho certeza, para mim.

Agora saiu um outro livro (Isso é Grego Para Mim!, de Michael Macrone, da Universidade de Berkeley, pela Editora Rotterdan). Macrone, ainda garoto, vai buscar no grego e no latim, naqueles clássicos todos, as origens de algumas palavras e expressões. É uma delícia. Vou contar algumas:

ALTER EGO — Sêneca já dizia: "O que pode ser mais precioso que ter um amigo com o qual francamente possas falar a respeito de tudo? Um amigo assim é raro e, uma vez encontrado, deve ser diligentemente conservado, pois é como um outro eu (alter ego)". Só depois de Freud é que alter ego tomou o sentido de "uma identidade diferente de uma mesma pessoa".

O AMOR É CEGO — Viria da cegueira do Cupido, apontando sua seta dourada para alguma vítima. Mas pairam dúvidas, pois a cegueira do Cupido parece ter sido coisa pós-clássica.

AMOR PLATÔNICO — Claro, vem de Platão, é claro, que nutria um amor não sexual pelos seus jovens discípulos. "Na Grécia daquele tempo, não era raro adolescentes e rapazes se ligarem romanticamente a um homem mais velho, que ficava conhecido como o 'amante'." Parece que hoje em dia isso se chama pederastia. O meu amor, por exemplo, é um amor pratônico.

ARGONAUTAS — Era a nau de Jasão, construída por Argos, cujo nome, em grego, quer dizer veloz. Daí que veio a palavra dada aos aventureiros que chegaram na Califórnia em 1849, na grande Corrida do Ouro.

CALCANHAR DE AQUILES — Nem sempre Aquiles teve um calcanhar de Aquiles, que seria seu único ponto vulnerável. Conta a lenda que a flechada com que Páris o matou não foi bem ali que acertou.

CANÁRIO — Por que um pássaro teria o nome derivado de um cão (canis)? Foram originários de uma ilha que tinha muitos cães e pássaros (hoje as Ilhas Canárias, espanholas). Cães e pássaros foram levados para o continente. Os cachorros morreram, ficaram os canários.

SIRENE — Vem do canto das sereias, que tanto atraíam Ulisses e sua turma pelos mares. Apalavra sirene vem de sereia. Assim como as sereias chamavam os navegadores para a morte, hoje a sirene chama os operários para as fábricas. Sem contar a sirene da polícia, que coisa boa não chama.

CÍNICO — Mais uma vez, coisa de cachorro. Do grego kynicós, que significa "semelhante a cachorro". O apelido era dado aos filósofos de então e "trazia uma boa carga de desprezo por pessoas que não estavam lá muito preocupadas com a higiene pessoal e cujos costumes ascéticos colocavam-nas à margem do que considerava uma sociedade civilizada". Portanto, concluo eu, os hippies foram os cínicos dos anos 60.

FASCISTA — Os ajudantes de oficiais romanos usavam feixes (fascis, em latim) no ombro, como símbolo de autoridade. No final do século 19, na Itália, a palavra passou a significar "grupamentos políticos". Mussolini, antibolchevista, gostou do nome.

LACÔNICO — Quando Felipe da Macedônia escreveu aos magistrados de Esparta "Se eu entrar na Lacônia, reduzirei Esparta a pó", os lacônicos sucintamente responderam: “Se". Mais lacônico impossível.

MENTOR — Era um soldado, amigo de Ulisses, na Odisséia de Homero. Venceu uma batalha, salvando Penélope de uns tarados e o seu nome entrou para a história, embora não tenha vencido mais nenhuma luta.

OPERAÇÃO CESARIANA— Aqui pairam dúvidas. Todos sabem que Júlio César nasceu de uma cesariana. Mas acontece que, quando ele nasceu, ainda não era César. Chamava-se Caio Júlio. É como o caso do ovo e da galinha. Quem nasceu primeiro?

OSTRACISMO — "No século V a.C., os cidadãos votavam em seus inimigos públicos favoritos, escrevendo os nomes em um pedaço de cerâmica, utensílio que os gregos chamavam de óstrakon. Os vencedores eram prontamente banidos da cidade por dez anos." Ou seja, caíam no ostracismo.

QUEIMAR AS PESTANAS — Pitéas, líder popular ateniense, espicaça Demóstenes (aquele que treinava oratória com a boca cheia de pedras), dizendo que seus argumentos "cheiravam a lamparina" — em outras palavras, que eles revelavam demasiado estudo. Hoje diríamos que, para ele chegar aonde chegou, "queimava as pestanas".

SALÁRIO — "É aquilo que você recebe no final do mês e logo gasta em CD e despesas com o carro, mas, quando os soldados romanos recebiam seu salariam, era para que pudessem comprar sal, importado e precioso."

TRAGÉDIA — Supõe-se que a palavra vem de tragoidía, que significa "canção do bode". Bode, em grego é trágos. Deve ser verdade, porque, afinal, toda tragédia é um verdadeiro bode.

                                                                                                                                             Mário Prata



segunda-feira, 11 de junho de 2012

Exercícios da "máquina registradora"


EXERCÍCIO DA "MÁQUINA REGISTRADORA" 


A HISTÓRIA: Um negociante acaba de acender as luzes de uma loja de calçados, quando surge um homem pedindo dinheiro. O proprietário abre uma máquina registradora. O conteúdo da máquina registradora é retirado e um homem corre. Um membro da polícia é imediatamente avisado. 

Declarações acerca da história: Verdadeiro – Falso – Desconhecido

1. Um homem apareceu assim que o proprietário acendeu as luzes de sua loja de calçados.

( ) Verdadeiro ( ) Falso ( ) Desconhecido

2. O ladrão foi um homem.

( ) Verdadeiro ( ) Falso ( ) Desconhecido

3. O homem não pediu dinheiro.

( ) Verdadeiro ( ) Falso ( ) Desconhecido

4. O homem que abriu a máquina registradora era o proprietário.

( ) Verdadeiro ( ) Falso ( ) Desconhecido

5. O proprietário da loja de calçados retirou o conteúdo da máquina registradora e fugiu.

( ) Verdadeiro ( ) Falso ( ) Desconhecido

6. Alguém abriu a máquina registradora.

( ) Verdadeiro ( ) Falso ( ) Desconhecido

7. Depois que o homem que pediu o dinheiro apanhou o conteúdo da máquina registradora, fugiu.

( ) Verdadeiro ( ) Falso ( ) Desconhecido

8. Embora houvesse dinheiro na máquina registradora, a história não diz a quantidade.

( ) Verdadeiro ( ) Falso ( ) Desconhecido

9. O ladrão pediu dinheiro ao proprietário.

( ) Verdadeiro ( ) Falso ( ) Desconhecido

10. A história registra uma série de acontecimentos que envolvem três pessoas: o proprietário, um homem que pediu dinheiro e um membro da polícia.

( ) Verdadeiro ( ) Falso ( ) Desconhecido

11. Os seguintes acontecimentos da história são verdadeiros: alguém pediu dinheiro - uma máquina registradora foi aberta - seu dinheiro foi retirado e um homem fugiu da loja.

( ) Verdadeiro ( ) Falso ( ) Desconhecido

terça-feira, 5 de junho de 2012

Crase

Aprenda a usar a crase cantando

"Cara a cara"
não tem crase
isto é fácil de guardar
com palavra repetida
não se deve “crasear”

Não se deve usar a crase
em casos especiais
com palavras masculinas
ou pronomes pessoais

Dona, senhora, senhorita
fazem caso genial
assanhadas vêm e aceitam
o artigo é fatal

Nome próprio masculino
uma crase aceitará
se com moda ou maneira
antes eu puder falar

Casa própria, a do falante
me rejeita o artigo
e se isso acontece
“crasear” eu não consigo

Se há um complemento
e é nominal
é só ter o feminino
e praticar normal

Objeto, indireto
faz um caso decisivo
se ainda vem trazendo
qualquer termo feminino

O poder do erro

Eu não queria escrever sobre esse tema, por esgotamento. Mas tenho lido tanta bobagem, com o tom furibundo das ignorâncias sólidas, sobre o livro didático que “ensina errado”, que não resisto a comentar. É impressionante como observações avulsas, sem contexto, eivadas de um desconhecimento feroz tanto do livro em si como de seu pressuposto linguístico, podem rolar pelo país como uma bola de neve, encher linguiça de jornais, revistas e noticiários e até mesmo estimular o “confisco” do material pela voz de políticos. Instituições de alto coturno, como a Academia Brasileira de Letras, manifestaram-se contra o horror de um livro didático que “ensina errado”. Até o presidente do Congresso, o imortal José Sarney, tirou sua casquinha patriótica. A sensação que fica é de que há uma legião de professores pelo Brasil afora obrigando alunos a copiar no caderno as formas do dialeto caipira, com o estímulo homicida do MEC (de qualquer governo – seria o fim da picada politizar o tema). Sim a educação brasileira vai muito mal, mas estão errando obtusamente o foco.

O que essa cegueira coletiva mostra, antes de tudo, é o fato de que a linguística – a primeira ciência humana moderna, que se constituiu no final do século 18 com o objetivo de compreender a evolução das línguas – não entrou no senso comum. As pessoas, letradas ou não, sabem mais sobre Astronomia do que sobre o funcionamento das línguas, mas imaginam o contrário. Eis uma cartilha básica, nos limites da crônica: toda língua, em qualquer parte do mundo e em qualquer ponto da história, é um conjunto de variedades; uma dessas variedades, em algum momento e em algumas sociedades, ganhou o estatuto da escrita, que se torna padrão, é defendida pelo Estado e é o veículo de todas informações culturais de prestígio; há diferenças substanciais entre as formas da oralidade e as formas da escrita (são gramáticas diferentes, com diferentes graus de distinção); a passagem da oralidade para a escrita é um processo complexo que nos faz a todos “bilíngues” na própria língua. Pedagogicamente, dar ao aluno a consciência das diferenças linguísticas e de suas diferentes funções sociais é um passo fundamental para o enriquecimento da sua formação linguística.

É função da escola promover o domínio da forma padrão da escrita, estimular a leitura e o acesso ao mundo letrado, e tanto melhor será essa competência quanto mais o aluno desenvolver a percepção das diferenças gramaticais da oralidade e da vida real da língua. Ora, todo livro didático de português minimamente atualizado reserva um capítulo ao tópico da variedade linguística e ao papel da língua padrão dentro do universo das linguagens cotidianas. Num país de profundos desníveis sociais como o Brasil, o reconhecimento da diferença linguística é o passo primeiro para o pleno acesso à escrita e sua função social. Será isso tão difícil de entender? 

* Cristóvão Tezza é autor do romance O filho eterno, cronista do Gazeta do Povo e autor de livros didáticos.

FONTE: Jornal Gazeta do Povo, em 24/05/2011

Exercícios Literários

Texto I

A Literatura é o retrato vivo da alma humana; é a presença do espírito na carne. Para quem, às vezes, se desespera, ela consola, mostrando que todo ser humano é igual, e que toda dor parece ser única; [...]
A moléstia é real, os sintomas são claros, a síndrome está completa: o homem continua cada vez mais incomunicável (porque deturpou o termo Comunicação), incompreendido e/ou incompreensível, porque voltou-se para dentro e se auto-analisa continuamente, mas não troca com os outros estas experiências individuais; está "desaprendendo" a falar, usando somente o linguajar básico, essencial e os gestos. Não lê, não se enriquece, não se transmite. Quem não lê, não escreve. Assim o homem do século XX, bicho de concha, criatura intransitiva, se enfurna dentro de si próprio, ilhando-se cada vez mais, minado pelas duas doenças do nosso tempp: individualismo e solidão.
(Ely Vieitez. Laboratório de literatura. São Paulo: Estrutural, 1978.)


Texto II

A literatura tem sido, ao longo da história, uma das formas mais importantes de que dispõe o homem, não só para o conhecimento do mundo, mas também para a expressão, criação e re-criação desse conhecimento. Lidando com o imaginário, trabalhando a emoção, a literatura satisfaz sua necessidade de ficção, de busca de prazer. Conhecimento e prazer fundem-se na literatura, e na arte em geral, impelindo o homem ao equilíbrio psicológico, e faz reunir as necessidades primordiais da humanidade: a aprendizagem da vida, a busca incessante, a grande aventura humana.
(Alice Vieira. O prazer do texto . São Paulo: E.P.U., 1978, p. XI.)

Texto III

A literatura não existe no vácuo. Os escritores, como tais, têm uma função social definida, exatamente proporcional à sua competência COMO ESCRITORES. Essa é a sua principal utilidade. Todas as demais são relativas e temporárias e só podem ser avaliadas de acordo com o ponto de vista particular de cada um. [...]
A linguagem é o principal meio de comunicação humana. Se o sistema nervoso de um animal não transmite sensações e estímulos, o animal se atrofia.
Se a literatura de uma nação entra em declínio, a nação se atrofia e decai.
(Ezra Pound. ABC da literatura. São Paulo: Cultrix, 1977, p. 36.)

Texto IV

[...] o processo de leitura apresenta-se como uma atividade que possibilita a participação do homem na vida em sociedade, em termos de compreensão do presente e passado e em termos de possibilidade de transformação cultural futura. E, por ser um instrumento de aquisição e transformação de conhecimento, a leitura, se levada a efeito crítica e reflexivamente, levanta-se como um trabalho de combate à alienação (não racionalidade), capaz de facilitar ao gênero humano a realização de sua plenitude (liberdade).
(Ezequiel T. da Silva. Leitura & realidade brasileira. Porto Alegre: Mercado Aberto, 1988, p. 22-23.)

Questões
1) Os quatro textos discutem o papel social da literatura e do escritor. De acordo com:
a) o texto I, de que forma a literatura pode contribuir no combate ao "individualismo e solidão"?

b) o texto II, quais são as duas necessidades humanas essenciais que a literatura atende?

c) o texto III, qual é a principal função social que um escritor pode ter?

d) o texto IV, por que a literatura é considerada um meio para combater a alienação e levar o homem a alcançar a liberdade?

2) Explique a semelhança de pontos de vista entre o texto I e a seguinte frase do texto II: "Conhecimento e prazer fundem-se na literatura, e na arte em geral, impelindo o homem ao equilíbrio psicológico".

3) Explique em que aspecto os textos II e IV se aproximam.

4) O Brasil é um país de milhões de analfabetos e mesmo os alfabetizados leem pouco. Os livros novos dos melhores escritores brasileiros raramente alcançam uma tiragem superior a dez mil exemplares. Confronte essas afirmações com o último parágrafo do texto III e explique as conseqüências da falta de leitura.

(CEREJA, William Roberto, MAGALHÃES, Thereza Cochar. Português: linguagens:literatura, produçao de texto e gramática. 3a. ed. rev. e ampl. São Paulo: Atual, 1999, pp. 32-36.)